Levantamento da Abrage aponta que parque gerador do Brasil deve ganhar mais 86,4 GW de potência com investimentos na fonte hidrelétrica
As hidrelétricas têm potencial para aumentar a capacidade de geração de energia em 86,4 GW (gigawatts) no País, o que representaria um ganho de 79% em relação à potência instalada atual, de 109 GW, segundo estimativa da Associação Brasileira de Empresas Geradoras de Energia Elétrica (Abrage).
As projeções da entidade consideram apenas as usinas hidrelétricas (UHEs), ou seja, as usinas de grande porte. Para a diretora-presidente da associação, Marisete Dadald Pereira, o uso desse potencial ajudaria a dar confiabilidade ao sistema elétrico no futuro em episódios de seca como o atual.
O potencial, conforme a Abrage, contempla a ampliação e modernização das centrais hidrelétricas atuais, além da viabilização ambiental de novas construções que estão em estudo e também a adoção do modelo de usinas hidrelétricas reversíveis (UHR) no Brasil, que são amplamente utilizadas no mundo como “baterias naturais”. Pelo modelo, há dois reservatórios, um superior e outro inferior, conectados e geralmente menores que uma usina tradicional no Brasil.
A vantagem é a capacidade de armazenar energia, bombeando água para um reservatório superior em momentos de baixa demanda ou de excesso de oferta, e liberando-a para gerar eletricidade em períodos de alta demanda. A adoção das UHRs, seja em hidrelétricas existentes ou novas, garantiria 38 GW.
Só com o aprimoramento das geradoras existentes, seria possível uma adição de 18,4 GW de capacidade, sendo 7,4 GW de investimento em 12 usinas para adicionar novas turbinas em espaços físicos já existentes e na ampliação de outras duas hidrelétricas, como para aumentar as casas de força, e mais 11 GW fruto da repotenciação de usinas existentes, ou seja, investimentos para modernizar turbinas antigas e ampliar a potência de hidrelétricas prontas.
A usina de Itapebi (BA), no rio Jequitinhonha, na divisa com Minas Gerais, é uma das que possui possibilidade de ampliação, segundo a associação que representa mais de 90% da geração hidrelétrica no Brasil. Ainda segundo a Abrage, levando em consideração usinas em Minas Gerais há possibilidade de motorização adicional em Jaguara, Três Marias, São Simão (MG/GO).
Com a viabilização de projetos de construção de 42 hidrelétricas em estudo, que aguardam licenciamento ambiental prévio, o País passaria a contar com 30 GW a mais.
No caso dos 7,4 GW que podem ser adicionados, a diretora-presidente da Abrage explica que os projetos podem competir no próximo Leilão de Reserva de Capacidade na forma de Potência (LRCAP). O certame, que deve ocorrer até o início do próximo ano, contrata a potência de usinas que ficam como back-up do sistema, sendo acionadas nas horas de maior pico de demanda. O leilão terá, pela 1ª vez, a contratação de hidrelétricas.
Defensores das hidrelétricas
A construção de novas usinas hidrelétricas, uma possibilidade que havia sido deixada de lado depois dos impasses ambientais gerados por Belo Monte, ensaia um retorno, com diversos defensores, como a Federação das Indústrias do Estado Minas Gerais (Fiemg).
A entidade defende a revisão na política energética para uma melhor utilização do uso múltiplo da água, como o aproveitamento do potencial das hidrelétricas para armazenamento, regularização de rios, irrigação e promoção da sustentabilidade das comunidades ao redor.
Na semana passada, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) habilitou cinco Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) em Minas Gerais a avançarem nos processos de licenciamento ambiental. Os despachos foram publicados no Diário Oficial da União (DOU) do último dia 16.
Além da Fiemg, em maio deste ano, o vice-governador de Minas Gerais, Mateus Simões (Novo), defendeu a volta de investimentos em hidrelétricas pelo Estado. Ele representou o governo estadual na terceira reunião do Grupo de Trabalho de Transições Energéticas do G20, que aconteceu no Minascentro, na região Centro-Sul de Belo Horizonte.
Na ocasião, ele disse que Minas Gerais tem um potencial não utilizado considerável e que os estudos indicam que é possível dobrar a capacidade de produção hidrelétrica no Estado. No entanto, Simões defende que a responsabilidade não seja da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig). Na opinião do vice-governador, a companhia precisa concentrar seus investimentos na melhoria da rede de distribuição.
Comentário do Engenheiro e CEO da ENERCONS Ivo Pugnaloni
Para o CEO da ENERCONS, engenheiro eletricista Ivo Pugnaloni, a carga no sistema elétrico que essa nova unidade industrial vai acrescentar não poderá ser sustentada por geração solar, altamente influenciada por dias nublados, chuvosos e pelo inexorável horário depois das 16 horas, quando o sol vai se pondo. “Só fontes hidrelétricas ou termelétricas podem suprir cargas como essa, pois são permanentes. Resta saber se o Ministério de Minas e Energia vai preferir gerar energia elétrica com água nacional, ou com derivados de petróleo importados, caríssimos e poluentes” comentou.
Pugnaloni lamentou estar ainda paralisada nas assessorias do MME , há três anos, a precificação das externalidades ( benefícios e prejuízos adicionais ao meio ambiente) de cada fonte. “Talvez seja a ação dos poderosos “lobbies” aos quais se referiu o próprio ministro Silveira na sua excelente entrevista à CNN, semana passada”, disse o executivo que foi diretor de planejamento da COPEL , concessionária do Paraná.
“Não há como negar que as assessorias do MME estarão fazendo o governo incorrer em grave risco de judicialização caso o Leilão de Reserva de Capacidade não venha a atender ao artigo 26, parágrafo 1-G que determina que todos os benefícios ambientais e de garantia de fornecimento sejam considerados, nos certames como esse, que envolvem centenas de bilhões de reais em energia elétrica, disse ele.
“Vejam leitores o que diz a Lei 9784/99 Art. 26 § 1º-G. “O Poder Executivo federal definirá diretrizes para a implementação, no setor elétrico, de mecanismos para a consideração dos benefícios ambientais, em consonância com mecanismos para a garantia da segurança do suprimento e da competitividade, no prazo de 12 (doze) meses, contado a partir da data de publicação deste parágrafo. Se isso não aconteceu, o MME corre o risco de um mandado de segurança interromper todo esse processo de compra enorme, pois a data de publicação deste parágrafo foi 01.03.21. E quem aviusa, geralmente, amigo é”, adendou.
“O atual governo brasileiro precisa entender, de uma vez por todas, que não basta geração solar e eólica para fazer a transição energética, pois elas são fontes intermitentes. Param de uma hora para a outra de produzir. Essas duas fontes são muito boas, mas tem esse grave defeito. Sem novas hidrelétricas para completar a geração faltante da solar e eólica a cada momento, a nossa matriz vai ter que usar cada vez mais termelétricas que já são, graças às manobras desses lobbies, mais de 37% da capacidade instalada do Brasil”, concluiu preocupado Ivo Pugnaloni.