O crescimento da capacidade de geração de energia para atender grandes consumidores se tornou um problema para o setor elétrico brasileiro e autoridades já falam em encontrar maneiras para interromper o fluxo de novos investimentos.
Com a demanda estagnada pela desaceleração econômica, os novos projetos entram no sistema para competir com energia velha, o que levou a um cenário de sobreoferta de eletricidade no país, que onera ainda mais a conta de luz.
Segundo estimativa da consultoria PSR, o excedente de oferta no mercado regulado gira hoje em torno de 27% e deve bater 30% em 2025. O cenário reflete tanto razões conjunturais, como o elevado nível dos reservatórios, quanto estruturais, como o aumento da oferta de renováveis.
O tema foi citado como uma das principais preocupações do setor no Fórum Brasileiro de Líderes em Energia, no Rio de Janeiro. O diretor-geral da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), Sandoval Feitosa, chegou a propor pausar o crescimento da oferta.
A explosão de investimentos em renováveis para grandes consumidores responde ao elevado custo da energia no mercado regulado, aquele atendido pelas distribuidoras. É incentivada também por subsídios a consumidores que optem por essas fontes de suprimento.
O presidente da Abradee (Associação Brasileira das Distribuidoras de Energia Elétrica), Marcos Madureira, diz que o processo gera um círculo vicioso: quanto mais consumidores deixam o mercado regulado, mais cara fica a energia para quem fica, levando mais empresas a cogitar sair.
“Quando um consumidor vai para o mercado livre, deixa a conta para quem fica”, afirma. A situação se agrava em um momento de reservatórios cheios e preços baixos da energia, porque as distribuidoras são obrigadas a vender a sobra no mercado livre.
Isto é, energia que o consumidor comprou, em média, a R$ 260 por MWh acaba sendo negociada com prejuízo, a R$ 69 por MWh, preço mínimo do mercado livre, vigente atualmente.
Além disso e dos subsídios na transmissão, o consumidor comum ainda paga os custos da expansão do sistema de transmissão para transportar a produção das novas usinas renováveis construídas para atender ao mercado livre.
“A expansão da transmissão não está sendo feita para atender a demanda, mas para viabilizar esses novos projetos de geração”, diz Madureira. Projetos hidrelétricos também perdem competitividade, por não conseguirem concorrer com os R$ 140 por MWh das novas fontes renováveis, acrescenta.
O secretário-executivo do MME (Ministério de Minas e Energia), Efrain Cruz, fez um apelo aos agentes do setor que debatam um “grande acordo” para reduzir essas assimetrias, que vêm encarecendo as tarifas, principalmente dos clientes que não têm condições de sair das distribuidoras.
“Não podemos deixar as assimetrias do setor elétrico recaírem sobre os mais carentes”, afirmou. “Não podemos ter distorções que façam com que os mais pobres paguem mais do que aqueles que realmente podem.”
Ele questionou que grandes empresas beneficiadas pelos subsídios usem as renováveis para passar uma imagem de sustentáveis e adequadas às regras de ESG, enquanto contribuem para distorcer o mercado. “Precisamos que todos reflitam o caminho que estamos trilhando.”
Sandoval afirmou que a Aneel não tem muitos elementos para mudar o cenário, já que subsídios foram aprovados pelo Congresso e que os contratos das distribuidoras têm que ser cumpridos, e pediu maior atenção de governo e Congresso ao tema. “A Aneel cumpre a lei.”