Durante a posse do novo diretor-geral da usina de Itaipu Binacional, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva destacou o não aproveitamento da água da hidrelétrica e reacendeu o debate sobre os desafios da geração hidrelétrica no Brasil.
Ao chegar de helicóptero em Foz do Iguaçu (PR), Lula observou as comportas da megausina abertas e comentou sobre o vertimento turbinável, uma forma técnica de dizer que a hidrelétrica está liberando água sem gerar energia. “Quando vejo Itaipu vertendo água fico imaginando quantos dólares estamos perdendo”, disse o petista.
O problema em Itaipu se reflete nas principais hidrelétricas do Brasil, que ano após ano têm aproveitado cada vez menos a água para geração de energia e parte significativa desse volume é jogado fora. As comportas da Hidrelétrica de Furnas foram abertas após 11 anos. As usinas de Jirau e Santo Antônio, do Rio Madeira, operam abaixo da capacidade e estão jogando água por conta de um incêndio no linhão que está limitando o escoamento da produção.
Da mesma forma, as usinas de Belo Monte, Tucuruí, São Simão, as das bacias do Rio São Francisco, entre outras, abriram as comportas sem gerar energia. Segundo dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), no primeiro bimestre, as hidrelétricas deixaram de gerar 17,9 milhões Megawatt-hora (MWh). Em equivalências energéticas, o montante é maior que o consumo médio de toda a região Sul ou Nordeste do país no mesmo período.
De fato, o regime hidrológico tem sido favorável neste período chuvoso, mas está dentro da média da última década. Além disso, o fraco crescimento da demanda associado à sobreoferta de energia causada pela entrada de usinas eólicas e solares, falta de reservatórios para armazenamento; e a restrição para exportação de energia excedente a países vizinhos são alguns dos fatores que ajudam a entender o cenário.
“Quem sabe, num futuro próximo, a gente estará produzindo hidrogênio verde dessa água de Itaipu e a gente estará ganhando dinheiro nas duas pontas. E vai ser melhor para o Paraguai, e muito melhor para o Brasil”, completou Lula.
Especialistas avaliam que o Brasil não sabe lidar nem com a escassez nem com a abundância de energia no sistema, já que em 2021, o país passou pela pior crise hídrica dos últimos 91 anos e dois anos depois está desejando a água escorrer pelo ralo. Ao passo que o Uruguai vive uma grande seca, o Brasil joga água fora, pois a interconexão de Garabi, na fronteira com a Argentina, consegue exportar apenas 2200 MW médios.
”O Brasil está percebendo as oportunidades da efetiva integração energética na América Latina. A regulação está cada vez mais flexível para exportar e importar. Os números mostram que os resultados ainda são tímidos, que precisamos acelerar os investimentos bilaterais nas interligações com linhas e conversoras”, diz o vice-presidente da Comissão de Integração Energética Regional (CIER), Celso Torino.
Há bastante tempo, o ex-diretor da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Edvaldo Santana, vem chamando atenção sobre a sobreoferta de energia. Além dele, o CEO da Engie, Maurício Bähr, alertou que o país precisa encontrar alternativas para uso racional de energia de hidrelétricas.
Em entrevista exclusiva ao Valor, o diretor-geral de Itaipu, Enio Verri, lembrou que não há demanda suficiente no Brasil por conta do fraco crescimento da economia, que ainda persiste no país. Ele concorda que há uma precariedade na integração energética no cone Sul, que limita a exportação do excedente a outros países
“Se a usina tem capacidade de produzir, mas está vertendo é porque não estou sendo demandada (…). O presidente Lula insistiu muito na integração e a integração energética está dentro desta política maior de integração. Conversei com o Felix Sosa, da Ande [estatal paraguaia que controla Itaipu] e ele colocou o desafio de conversarmos mais sobre essa integração energética”, diz Verri.