Com redução na matriz e dificuldades para implementar novos projetos, setor discute desafios e perspectivas para os avanços da geração hídrica como base do sistema elétrico
O Brasil deverá ter recorde histórico em 2023 na expansão da geração de energia, segundo estimativas apresentadas nessa semana pelo Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE). A perspectiva do crescimento se dará principalmente pelo incremento das tecnologias eólica e solar no mercado livre e na Geração Distribuída, o que impõe alguns pontos de atenção quanto ao equilíbrio e segurança do sistema, sobretudo quando se nota cada vez mais a redução da participação de hidrelétricas na matriz e os desafios que essa importante fonte de base vem passando para instalação de novas turbinas.
Atualmente a capacidade de produção elétrica nacional conta com 190 GW de potência nominal, segundo dados recentes da Aneel, com destaque para 103,2 GW de usinas hídricas, 46,1 GW de térmicas e 24,92 GW em eólicas. A geração solar totaliza 26 GW conforme monitoramento da Absolar, sendo 18,1 GW de GD, segmento não fiscalizado pelo regulador, sobrando 7,9 GW das usinas de grande porte nos dados computados pelo regulador.
Para muitos agentes do setor esse é um momento propício e crucial para discussão dos caminhos e decisões que o país terá que tomar visando a manutenção de uma matriz renovável confiável, no sentido da disponibilidade da oferta de energia a rede. Hoje a intermitência do vento e do sol são supridas em parte pelos reservatórios das UHEs e em outra parte pelo despacho das UTEs, a maioria movidas a gás natural. Já no futuro uma alternativa pode ser o uso de baterias, como as de lítio.
Ampliação da UHE São Simão pode adicionar mais de 1 GW entre quatro novas unidades geradoras (GE)
No entanto a expansão da hidreletricidade no país continua encontrando muitas dificuldades no campo socioambiental e na perda da competitividade de custo e preço dos projetos. Para o presidente do Fórum das Associações do Setor Elétrico (Fase), Mário Menel, e outras fontes ouvidas nessa reportagem, um ponto fundamental dessa discussão passa pela revisão dos atributos das fontes e a correta valoração e remuneração aos geradores pelos serviços prestados para além da produção de energia.
“Um novo arranjo comercial trará sentido para as hídricas, que podem mudar seu papel para o acompanhamento da curva de carga, ficando em stand by para numa emergência entrar rapidamente no sistema”, disse o executivo à Agência CanalEnergia, afirmando que será necessário ajustar o Mecanismo de Realocação de Energia (MRE) e lidar com a falta de armazenamento hídrico inclusive para usos múltiplos d’água.
Questionado sobre quando essa nova regulamentação pode acontecer, Menel, que também preside a Associação Brasileira de Investidores em Autoprodução de Energia (Abiape), disse que se reuniu há poucos dias com o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) para tratar do tema, lembrando de um projeto que está em curso no órgão e na Aneel para uma simulação de como ficariam as questões envolvendo os serviços ancilares, prestados normalmente e alguns exclusivamente por hidrelétricas. Após algumas comprovações a ideia seria fazer um leilão específico para contratações nessa modalidade, delimitando uma região e um regramento por tempo determinado para experimentação, o chamado sandbox.
“Se o projeto for aplicado nesse ano podemos ter uma experiência muito boa no curto prazo, com novos leilões a partir de 2024”, aponta o dirigente, que vê atualmente os geradores hídricos totalmente desestimulados para qualquer negócio de maior rendimento, visto serem deslocados e ainda terem problemas pela legislação imposta dos 8 GW de térmicas inflexíveis na lei da privatização da Eletrobras.