Certame seria de capacidade flexível e está entre as soluções em estudos para remunerar esse atributo, especialmente das hídricas.
No âmbito do debate setorial cada vez mais aceso para que sejam precificados os atributos das fontes geradoras, especialmente das hidrelétricas, o engenheiro Jairo Terra, consultor de Assuntos Regulatórios da PSR, propôs, em entrevista a EnergiaHoje, a realização de leilões de capacidade flexível como forma de remunerar usinas com essa qualidade.
“Em vez de somente leilões de capacidade [como já vêm sendo feitos], desenhar um leilão de capacidade flexível para contratar essa característica do gerador”, sugeriu. Terra disse que a equipe da consultoria vem trabalhando com um pool de geradores, principalmente hidrelétricos, coordenado pela Apine, com o objetivo de definir o valor do benefício da flexibilidade para o SIN.
“Se não tivéssemos aquela hidrelétrica que consegue mudar o ritmo de geração de uma hora para outra o custo do sistema seria muito maior”, constata. A partir dessa constatação, os especialistas estão calculando o custo do sistema com flexibilidade versus sem flexibilidade para, segundo Terra, desenhar mecanismos que remunerem o gerador flexível. O leilão seria uma dessas formas.
Uma conclusão que salta aos olhos dessa busca por separar os atributos das fontes para remunerá-los corretamente é o elevado custo da inflexibilidade, constatação que trás de volta ao debate os oito GW de térmicas a gás com 70% de inflexibilidade colocados como “jabutis” na lei de privatização da Eletrobras.
“Pode ser que no final dessa reforma em curso a gente descubra que a térmica inflexível é viável economicamente, não quero prever o futuro. Mas hoje, se tudo fosse separadinho [os atributos], acho que não precisaríamos dessas usinas inflexíveis”, avalia Terra.
A diretora de Técnica da PSR, Angela Gomes, vai mais longe: “Mesmo não havendo remuneração pela flexibilidade, essas térmicas já não entrariam normalmente no sistema. Hoje temos uma sobreoferta de energia e essas térmicas têm um preço-teto de R$ 450 MWh e se fala em elevar esse valor. Nossa previsão é que elas custarão R$ 23 bilhões por ano, se entrarem todos os oito GW, para prover um serviço que o sistema não precisa. É uma distorção do mercado!”, analisou.
Para a especialista, não adianta muito o país sofisticar o mercado, estudar alternativas de precificação adequada das fontes e seus atributos se, paralelamente, “estiverem correndo por fora energias dessa natureza, colocadas compulsoriamente”. Por esse caminho, na avaliação de Gomes, “o Brasil nunca vai ter um mercado.”
Reversíveis e baterias
Em outro importante debate em curso no setor elétrico, a crescente necessidade de armazenamento para cobrir a variabilidade das eólicas e solares, um tema mais do futuro no Brasil, uma vez que as hidrelétricas convencionais por enquanto fazem muito bem essa cobertura, os técnicos da PSR avaliam que as duas soluções são factíveis e desejáveis.
Mas eles também entendem que, pela longa experiência com hídricas e pela disponibilidade de locais para colocá-las, as reversíveis pulam à frente por aqui, diferentemente de outras regiões do planeta, como a Europa. “O Brasil é muito mais plural em termos de fontes”, ressalta Terra para justificar a menor premência por baterias por aqui.
O consultor afirma que “o Brasil tem uma capacidade gigantesca para reversíveis, até porque elas não têm o principal ponto negativo das hidrelétricas convencionais, a necessidade de grandes reservatórios e suas restrições ambientais”. Gomes lembra que a reversível precisa, basicamente, de declives acentuados e arrisca afirmar que hoje, no Brasil, ela seria “muito mais competitiva do que a bateria em si”.
As possíveis soluções de local para construir reservatórios de reversíveis com baixo impacto ambiental no Brasil são muitas. Entre as elencadas pelos técnicos da PSR estão o aproveitamento de terrenos degradados em áreas elevadas às margens de rios, bombeando água diretamente dos seus leitos.
Outra seria fazer o reservatório superior às margens de um reservatório convencional. Ou mesmo uma reversível sem um novo reservatório, aproveitando dois lagos convencionais em rios que tenham muitas usinas já instaladas para bombear da barragem de jusante para a de montante.
“Há um meio do caminho já feito para as reversíveis no Brasil, mas eu gosto das duas”, afirma Terra. Ele destaca que as baterias levam vantagem em soluções modulares de pequeno porte, pela facilidade de poderem ser acopladas a subestações, até urbanas, para socorrer a rede em horários de pico, como mostra a experiência-piloto da Isa Cteep no litoral Sul de São Paulo.
Mais uma vez, nesta questão do armazenamento, os técnicos ressaltam que falta o dever de casa para dar competitividade aos serviços a serem gerados. “Reversível não produz energia, ela só desloca”, resume Terra.